O cultivador





Havia um homem que cultivava a terra para plantar um trigal. Vivia debruçado sobre a enxada, do amanhecer ao pôr do sol. Depois, juntava-se à família para gozar as delícias do aconchego familiar da esposa e dos filhos.

Não importava o tempo que fizesse: sol, chuva, vento, frio ou calor. Lá estava o homem a trabalhar a terra, a libertá-la das ervas daninhas, a providenciar o adubo, colocar a semente na intimidade da cova, providenciar a água.

Aquela atividade contínua despertou o interesse de um viajante que por ali passava com regularidade. Certo dia, o viajante se aproximou do cultivador e lhe perguntou:

” – Bom homem, vejo que estás velho e cansado. Por que não descansas dessa lida tão rude?”  Sem se deter, o agricultor respondeu: ” – Não posso. Amo a terra! Amo meu trabalho. E por estar velho e cansado devo andar mais depressa. Tenho menos tempo a dispor e muito a fazer.”

O viajante alongou a vista pelo imenso trigal, que balançava ao vento como mar de ouro líquido e comentou: ” – A terra recompensa o teu amor. O trigal está maravilhoso e será produtiva a colheita.”

” – Mas não sou eu quem colhe”, respondeu o agricultor. “Eu apenas planto. Minha mulher e meus filhos é que fazem a colheita da generosidade do solo.”

O viajante se despediu e seguiu o seu caminho. Necessitando empreender uma grande viagem, ausentou-se por vários meses. Retornando, ao passar pela mesma estrada, encontrou o mesmo homem às voltas com o trigal. Era uma tarde fria, sem sol. A natureza toda parecia chorar, desanimada.

O viajante se aproximou do trabalhador incansável e observou que sulcos profundos lhe vincavam a face. Estava mais cansado, envelhecido e triste. Vestia-se de luto.
” – Perdeste algum ente querido?” –  perguntou.
O cultivador, com voz arrastada, respondeu:
” – Perdi, senhor. Toda minha família. Em poucas semanas, um a um se foram, devorados por febre maligna. Fiquei sozinho.”

O viajante se comoveu com tanta dor. Entretanto, por observá-lo ainda a trabalhar, sem descanso, na terra, ousou perguntar:
” – Se toda tua família morreu, por que continuas nesta tarefa cansativa? Já não tens mais quem colha os frutos. Semeias o trigo, mas nem tua mulher, nem teus filhos irão colher as espigas maduras.”
” – Ah, senhor!”, respondeu o outro, parando por um instante seu trabalho. ” – Isso não me preocupa, prosseguirei plantando. Quem necessitar virá colher o trigo farto. E são tantos os que têm necessidades!”  Surpreso pelo desprendimento do camponês, o viajante concluiu:

" – Tens razão, bom homem. Oxalá fossem muitos como tu, a plantar sem esperar a colheita."

A noite descerrou seu manto e tudo escureceu. Naquela noite, o agricultor se recolheu com a alma invadida por intensa saudade. Recostou-se no leito e dormiu. Despertou, logo além, em um trigal pleno de luz, onde o aguardavam seus amores, felizes, de braços abertos.


– Texto Adaptado por Anéria Lima




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